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25/04/2019 12:41
Saúde
O que ninguém diz às mulheres sobre o que acontece com o corpo depois dos 40
/ Reprodução

Os sintomas começaram sutis: insônia, coração batendo acelerado, uma palavra que me foge da cabeça, às vezes uma palavra errada. Mas, em questão de meses, não havia mais como negar. Não demoraram a chegar ataques de pânico, crises de choro e aquela emoção proibida das mulheres de meia-idade: a raiva. Logo depois do meu aniversário de 40 anos, sangrei dez dias sem parar.

 

 

Tentando entender essas transformações, eu voltava a todo momento a uma recordação de infância. Eu tinha 8 anos e estava sentada sobre o tapete felpudo cor de laranja da sala em nossa casa em Midwood, Brooklyn. A família estava reunida em volta da nossa TV a cores assistindo a um episódio de “All in the Family”. Archie Bunker estava gritando com sua mulher, Edith, mandando-a passar logo pela “mudança de vida”. Enquanto eu me esforçava para acompanhar o que estava acontecendo, meus pais davam risadinhas com jeito de quem entendeu tudo. Essa foi a totalidade do que me foi ensinado sobre a menopausa. Mas Edith aparentava ter mais de 50 anos, e eu imaginava que ainda tinha uma década inteira pela frente antes de precisar “passar pela mudança”.

 

 

Liguei para minha ginecologista, preparando-me para explicar a anomalia, na esperança de convencê-la que eu era uma aberração da natureza. Mas a enfermeira me interrompeu, introduzindo uma nova palavra em meu vocabulário: perimenopausa.

 

 

Foi nesse momento que fiquei sabendo que, antes da menopausa, existe um inferno completamente distinto, mas relacionado de alguma maneira, chamado perimenopausa. Segundo a enfermeira, a perimenopausa assinala o início de um declínio gradual do estrogênio em meu corpo. “E tem mais”, ela acrescentou, “pode durar anos”. Ela proferiu essa última parte como se estivesse me explicando as regras de um clubinho especial que só é acessado por quem recebeu um convite. Eu quase imaginei que receberia um cartão de identificação.

 

 

Mas eu era capaz de ler nas entrelinhas. O que ela estava dizendo, na realidade, era: este é o momento em que seu corpo e sua mente começam a lhe trair. Liguei para minhas amigas para comentar o assunto. E me tornei a portadora de más notícias.

 

 

“Você estavam sabendo disso?”, indaguei, me perguntando se todo o mundo já estava por dentro do segredo. Minhas amigas fizeram silêncio. Todas nos tínhamos sido enganadas. Ninguém nos falara nada sobre isso.

 

 

Quando eu estava grávida, outras mulheres me bombardeavam com conselhos, possivelmente porque a gravidez deveria supostamente ser um momento “de alegria” e as pessoas quisessem tomar parte nele. Mas isto aqui era diferente. Era o lado mais tenebroso de ser mulher.

 

 

Comecei a pesquisar na internet frases como “sexo na casa dos 40 anos”, “vivo furiosa com minha família” e “dor no seio esquerdo, será que estou morrendo?” Quando isso não rendeu respostas satisfatórias, comecei a marcar consultas regulares com uma médica naturopata, estudando os benefícios dos óleos essenciais, consumindo vitaminas e ervas como uma viciada e ficando obcecada por chás “de mulher” – hibisco, prímula, cardo-mariano, qualquer coisa que lembrasse uma flor belíssima aberta.

 

 

Pula cinco anos. Eu tinha 44 anos, meu filho era pré-adolescente, nós dois estávamos plenamente sob o efeito de ioiô dos fluxos hormonais e meu marido mergulhado profundamente em sua própria crise da meia-idade, pensando em desistir de sua empresa de ferramentas elétricas e nos levar todos para viver na América Central.

 

 

Comecei a trancar a porta do meu quarto, uma mudança aparentemente sísmica que ofendeu o resto da família mas com a qual criei um pequeno espaço para mim mesma para poder pensar, respirar e ler por algumas horas preciosas a cada noite e me adaptar às transformações crescentes do meu corpo: o anseio por silêncio absoluto, a nova sensibilidade aos cheiros, a obrigação de enfrentar o que me parecia ser uma sobrecarga sensorial.

 

 

E então, justamente quando comecei a abraçar aquela autonomia pela qual eu tanto sonhara, apareceu um obstáculo.

 

 

Quando a primeira menstruação não apareceu, neguei a possibilidade. Mas quando a data estimada da segunda chegou e passou sem que acontecesse nada, comecei a apalpar meus seios durante o banho para sentir se estavam doloridos e passar a mão sobre minha barriga para flagrar alguma firmeza inesperada. Depois do banho, ainda nua, eu olhava meu perfil no espelho, à procura de alguma diferença visível em meu corpo. Será que eu estava com aquela aparência iluminada? Não estava.

 

 

O Google não ajudou em nada. Como se Deus, o universo ou algum outro poder divino fizessem parte da conspiração para enlouquecer as mulheres de meia-idade, fui descobrir que os sintomas de gravidez são quase idênticos aos da perimenopausa: ganho de peso, seios mais sensíveis, sangramento intermenstrual. Eu estava com todos.

 

 

Minhas amigas e eu começamos a trocar confidências em voz baixa sobre nossas 'mudanças' nos encontros de clube do livro, grupos de redação criativa e nas tão raras 'noitadas de mamães'. Eu descobri que a perimenopausa é um segredinho desagradável que protegemos enquanto percorremos a vida. Todas ficamos fazendo de conta que estamos superando tudo superbem, mas no nosso íntimo viramos pessoas irreconhecíveis até para nós mesmas.

 

 

Meu marido estava pintando o deck quando eu cheguei um dia pela manhã para lhe dar a notícia. Eu esperara semanas, mas minha ansiedade, sempre quase na superfície, já estava virando um animal incontrolável. “Pode ser que eu esteja grávida”, falei sem preâmbulo. Ele parou no meio de uma pincelada. Pude ver seus pensamentos não expressos boiando como grãos de pólen no ar morno.

 

 

“Ok, a gente dá um jeito”, ele falou, voltando a mergulhar o pincel no balde de tinta.

 

 

Minha primeira gravidez me obrigou a passar cinco meses de cama, com o rótulo de “alto risco” pregado ao meu útero sensível. Além de complicações potencialmente fatais para mim e para o bebê, sofri de depressão pré e pós-parto que se arrastou por anos. Agora, diante da perspectiva de uma gestação descrita ofensivamente como “geriátrica” aos 45 anos de idade, a sorte não me era favorável. Sem falar na logística. Onde colocaríamos o bebê, para começo de conversa?

 

 

Dois dias mais tarde, quando não posso mais adiar o inevitável – o medicamento para hipertensão que tomo é prejudicial demais ao feto para eu poder continuar a tomar sem consultar o médico ?, eu me acomodo no chão do banheiro logo cedo pela manhã, lendo as instruções do exame de gravidez enquanto o resto da família ainda dorme em silêncio. Abro a embalagem com as mãos trêmulas. Eu me armo de coragem e aguardo os três minutos necessários.

 

 

Enquanto os segundos se arrastam, eu me pergunto se vou conseguir sentir a menor vontade de cuidar de um recém-nascido. Sofro ondas de calor no meio da noite que me levam a caminhar pelo quarto, arrancando minhas roupas e xingando o ar condicionado porque não contém a posição “temperatura subártica”. A simples ideia de ser despertada antes da hora de um sono conquistado a duras penas me dá taquicardia. Tomo diariamente não um, mas dois medicamentos cuja bula diz alguma coisa tipo “se você está mesmo cogitando engravidar mantenha distância absoluta deste medicamento”.

 

 

Minhas amigas e eu começamos a trocar confidências em voz baixa sobre nossas “mudanças” nos encontros de clube do livro, grupos de redação criativa e nas tão raras “noitadas de mamães”. Eu descobri que a perimenopausa é um segredinho desagradável que protegemos enquanto percorremos a vida. Todas ficamos fazendo de conta que estamos superando tudo superbem, mas no nosso íntimo viramos pessoas irreconhecíveis até para nós mesmas.

 

 

Depois que o assunto finalmente é trazido a tona e deixa de ser segredo, eu e minhas amigas começamos a falar dele mais abertamente, louvando as vantagens do Botox, silicone, vibradores e terapia como maneiras de nos empoderar e enfrentar esses anos. Definitivamente não estou disposta a me distanciar desta tribo de mulheres deslavadamente francas para formar novos relacionamentos com mães jovens e flexíveis, donas de estoques intermináveis de seu próprio colágeno natural.

 

 

Quatro riscos aparecem no bastãozinho. Chegou o resultado.

 

 

Não grávida.

 

 

Enxugo minhas lágrimas, desejando que alguém tivesse me avisado que eu passaria uma parte tão grande de minha meia-idade chorando no chão do banheiro. Se eu soubesse disso, teria colocado um piso mais bonito.

 

 

Fico sentada ali por alguns minutos e então engatinho até o lixo para enterrar o exame. Mas a tristeza que estou sentindo me surpreende. Eu poderia acordar meu marido, mas ele não entenderia o que significa estar na cúspide dos 45 anos fazendo um exame de gravidez. Ele não conseguiria compreender intrinsecamente o que significaria estar grávida nesta idade nem tampouco, por outro lado, como é arrasador saber que provavelmente nunca vou voltar a engravidar. As chances daquele segundo filho esquivo que eu nunca tive certeza se queria desaparecem no fundo da lata de lixo, soterradas sob lenços de papel usados. Antes das complicações da minha primeira gravidez eu planejara ter muitos filhos.

 

 

Tiro o exame da lata de lixo e o seguro junto ao meu coração, como se fosse um embrião de verdade, refletindo que eu, como tantas outras mulheres quarentonas, faço parte da geração sanduíche, a geração do meio – aquela que cuida tanto de seus filhos quanto de seus pais.

 

 

Mas quem está cuidando de nós enquanto nos aventuramos nesse terreno desconhecido? Quem está ali para nos dizer que é normal pegar o carro para ir ao trabalho e estar no meio do caminho quando percebemos que esquecemos de colocar as lentes de contato? Quem está ali para nos consolar quando ficamos sentadas no carro na fila para buscar nossos filhos na escola, chorando ao ouvir canções como “Shut Up and Dance with Me” porque não dançamos há anos? Quem está ali para nos levantar do chão do banheiro quando sentimos medo?.

 

 

Agarro a beira da banheira, observando sem querer que ela está precisando de uma limpeza, e me levanto. Indo até o espelho, avalio meu corpo, meu abdome arredondado, meu colo curtido pelo sol, os tríceps que não estão tão firmes quanto antes. Eu já mudei tanto. Deixei de me importar o que pensam os outros, comecei a me dar o direito de ter tempo para mim, formei minha própria tribo. Estou mais bela e autoconfiante do que já estive em qualquer outra fase da vida, mas ao mesmo tempo me tornei invisível para boa parte do mundo.

 

 

A perimenopausa é como se preparar para uma pós-graduação. Há tantas escolhas a fazer, tantas opções possíveis, só que hoje não conto mais com o amortecedor da juventude para me ajudar a me recuperar de meus erros.

 

 

Ouço uma bola de futebol batendo numa parede. Deixando meus pensamentos de lado, jogo o exame no lixo outra vez e fecho o saquinho para que meu filho pré-adolescente não o encontre por acaso. Abro o armário do banheiro e pego um vidrinho de óleo com perfume de lavanda. Coloco algumas gotinhas nos pontos de acupuntura. Me disseram que isso vai me ajudar a me deixar calma.

 

 

Por: Aileen Weintraub/msn.com

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