Recordo-me do saudosíssimo Dom Pedro Casaldáliga, ao qual a Igreja Católica deve oferecer a justiça de torná-lo santo um dia, assim como o fez com Dom Oscar Romero, um mártir em defesa das grandes causas cristãs e, sobretudo, das grandes causas humanas, que nos disse outrora algo que reverbera até hoje e continuará sendo atual e pertinente enquanto o mundo for explorado por um sistema desumano e anti-mundo. Disse Dom Pedro quando questionado a respeito do fim e do que restava da Teologia da Libertação: “Deus e os pobres!”
Essa afirmação nos conduz à percepção de que o divino em sua plenitude, Deus, se revela de tal modo a estender a mão ao humano que é vítima da opressão, socialmente marginalizado e relegado aos dissabores da anti-vida. Esse Deus, que é o mesmo revelado por Jesus Cristo, o Deus de amor e misericórdia, está aberto ao ser humano e tem preferência pela parcela castigada pelo sofrimento que é produzido socialmente, que tem raízes sócio-históricas e é reflexo de um modo de sociedade cuja máxima é a injustiça e a morte.
Um ser humano que não tem garantido o direito de viver bem, de aproveitar a vida e o que ela tem de melhor a oferecer, de ter um pedaço de terra para cultivar, de ter um teto para morar, de ter comida sempre que precisar saciar a sua fome, água sempre que precisar saciar a sua sede, educação de qualidade, saúde, uma boa cultura, acesso às artes, viajar para onde quiser, enfim, tudo isso que é negado aos empobrecidos é uma injustiça aos olhos de Deus que nos criou para a vida em abundância (cf. Jo 10, 10), para a plenitude do absoluto e da comunhão entre todos e todas.
Ter tudo isso garantido não é uma utopia (os gregos diriam que utopia é aquilo que não tem lugar e é impossível). A garantia disso é, na verdade, uma topia, ou seja, algo que possui um lugar e é possível: o Reino de Deus. Mas não um reino distante e localizado estritamente no plano da transcendência, da eternidade e que se alcança após a morte, mas um Reino que já se localiza a partir da história, portanto, um reino historicizado.
Tudo o que é essencial e importante para o humano e para o divino se concretiza no Reino de Deus (um Reino de amor, comunhão, justiça e paz; tudo que é possível de ser concretizado a partir da história até a eternidade, aí sim quando a vida assume sua dimensão última e plena). Foi por esse Reino, por pregar os seus princípios a começar pelos(as) sofredores(as), castigados(as) e empobrecidos(as) do mundo que Jesus foi assassinado.
A Espiritualidade e a Teologia da Libertação resgatam os fatos da opressão, da marginalização, do empobrecimento coletivo para reforçar os atos da libertação que está no núcleo da mensagem de Jesus (cf. Lc 4, 18-19). A Espiritualidade e a Teologia da Libertação jamais terão fim enquanto os cristãos e as cristãs que tomam a consciência e entendem que ao assumir o seguimento de Jesus Cristo se faz necessariamente uma experiência de transformação a começar por si mesmos(as) na periferia do mundo, se faz fundamentalmente uma opção preferencial pelos pobres, por aqueles e aquelas que menos vida têm e são condenados a morrerem antes do tempo. Aqueles cristãos e aquelas cristãs assumem isso com a própria vida e lutam diariamente por um mundo justo para todos e todas. Eis a ênfase da Espiritualidade e da Teologia da Libertação, sua atualidade e pertinência.
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