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O presidente da Argentina, Mauricio Macri, considera que o Mercosul estaria melhor sem a Venezuela; que o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff não foi um golpe; e que a parceria com o Brasil está acima das “políticas conjunturais” do momento. Ele manifestou essas opiniões nessa quarta-feira (28), em entrevista a um pequeno grupo de jornais brasileiros - cinco dias antes de receber o presidente Michel Temer, que viajará para Buenos Aires na próxima segunda-feira (3).
A viagem para a Argentina será a primeira visita bilateral de Temer, que, como presidente, fez duas viagens ao exterior – à China, para a reunião do G-20 (grupo dos vinte países mais desenvolvidos) e aos Estados Unidos (para a Assembleia Geral das Nações Unidas). Ele chegará a Buenos Aires no final da manhã, acompanhado de um grupo de ministros, para se reunir com Macri. Depois do almoço, Temer viajará a Assunção para um encontro com o presidente do Paraguai, Horácio Cartes.
Na agenda do encontro entre Macri, Temer e Cartes, que ainda não foi definida, estão temas que preocupam os três governos: o combate ao narcotráfico e ao contrabando na Tríplice Fronteira; a recuperação econômica regional (depois da queda dos preços das commodities); e o futuro do Mercosul, que hoje vive uma crise institucional.
Mercosul
Macri disse na entrevista aos jornais brasileiros que está muito preocupado com a Venezuela. Desde a campanha para as eleições presidenciais argentinas e depois de sua posse, em dezembro, ele tem criticado o presidente venezuelano Nicolás Maduro, por considerar que estava violando os Direitos Humanos ao prender líderes opositores, acusados de conspirar contra o governo ou de estimular a violência. “Sinto que o governo de Maduro radicaliza a sua posição, em vez de gerar uma abertura para o diálogo”, disse.
Em relação à permanência da Venezuela no Mercosul, ele foi mais enfático que a ministra das Relações Exteriores da Argentina, Susana Malcorra – candidata para ocupar a Secretaria-Geral das Nações Unidas. “Na minha opinião, a entrada da Venezuela não foi um acréscimo positivo ao Mercosul”, disse Macri. Segundo ele, o bloco regional teria avançado mais “sem a Venezuela de hoje”.
Além de citar o “colapso econômico” venezuelano (marcado por uma inflação anual de três dígitos e desabastecimento), Macri considera que o país “não respeita as normas democráticas”. Ele disse que, se o país não se adequar às normas do Mercosul até o dia 1º de dezembro, “deverá deixar de fazer parte” do bloco regional.
Dezembro é um mês crucial para o presidente venezuelano, em termos de política interna: a oposição, que há nove meses conquistou maioria parlamentar pela primeira vez em dezessete anos, está juntando assinaturas para fazer um referendo revogatório – mecanismo constitucional que permite destituir Maduro antes do fim de seu mandato, em 2019. Os oposicionistas acusam a Justiça Eleitoral de tomar partido do governo e fazer de tudo para atrasar o processo.
Três dos quatro fundadores do Mercosul (Argentina, Brasil e Paraguai) questionam a permanência da Venezuela no bloco regional, alegando que o país não cumpriu os requisitos necessários, no prazo estipulado (meados de agosto) para ser considerado membro pleno. Entre os vários acordos a serem incorporados, está um protocolo de defesa da democracia.
O Uruguai (por questões políticas internas) manteve-se neutro, mas assinou o documento, impedindo o governo venezuelano de assumir a presidência pro-tempore do Mercosul no final de junho (que é rotativa e muda a cada seis meses, de acordo com a ordem alfabética). Até dezembro, o bloco será administrado por um colegiado dos quatro membros fundadores. Se a Venezuela não cumprir suas obrigações até lá, corre o risco de ser suspensa.
Impeachment
Em relação ao impeachment no Brasil, Macri disse que a “continuidade política” foi respeitada, assim como os procedimentos jurídicos e constitucionais. “Hoje [o Brasil] é governado pelo vice-presidente da chapa do PT, que ganhou as últimas eleições [presidenciais]”, disse. Mas, segundo ele, Argentina e Brasil estão acima das conjunturas políticas de momento.
Macri disse que, mal assumiu a presidência argentina, viajou ao Brasil para manifestar sua vontade de “trabalhar em conjunto” com o maior parceiro comercial argentino – mesmo tendo menos “afinidades políticas” com a então presidenta Dilma Rousseff, que apoiou “de forma explícita” Daniel Scioli, candidato da ex-presidenta Cristina Kirchner e seu principal rival nas eleições argentinas.
O presidente argentino disse que não considera o impeachment de Dilma um golpe – apesar de saber que tanto no Brasil, como no exterior, existirem interpretações divergentes. Segundo ele, todo os passos constitucionais foram cumpridos, pelos poderes Judicial e Legislativo.
Crise
Temer e Macri vão se encontrar em um momento em que os dois países – principais sócios do Mercosul – atravessam uma crise econômica. Numa coletiva nesta quarta-feira, Macri anunciou que “um em cada três argentinos vive abaixo da linha de pobreza”, segundo pesquisa do órgão governamental Indec (Instituto Nacional de Estadísticas e Censo da Argentina) - o equivalente ao IBGE brasileiro.
Durante os dois mandatos da ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015), o Indec sofreu uma intervenção, que reduziu o índice inflacionário. Oficialmente o custo de vida subia cerca de 10% ao ano, enquanto que as consultoras privadas anunciavam um aumento três vezes maior – equivalente ao aumento salarial acordado entre o governo e os poderosos sindicatos argentinos
Ao assumir em dezembro, Macri prometeu reestruturar o Indec, para tornar suas estatísticas mais transparentes. Ao mesmo tempo, ele se comprometeu a reduzir a pobreza a zero. As primeiras estatísticas de seu governo mostram que 32% dos argentinos vivem na pobreza e 6,3% na indigência. Apesar de ter acabado com controles cambiais e reduzido impostos para incentivar o crescimento da economia, o Produto Interno Bruto (PIB) argentino encolheu 5,9% em julho – em comparação com o mesmo mês no ano anterior. Foi a maior retração em 14 anos.
Macri reconheceu que as estatísticas mostram uma realidade “dolorosa”, difícil de aceitar. Mas disse que, pelo menos agora, é possível ter uma verdadeira dimensão do problema que o país enfrenta – o que facilitaria encontrar soluções. A economia argentina depende em grande parte do desempenho do Brasil, seu principal sócio comercial. Em 2011, no auge do crescimento econômico dos dois países, o intercambio bilateral foi US$ 39 bilhões. Hoje gira em torno de US$ 26 bilhões.
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