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01/07/2018 08:19
Política
As manchetes podem esperar
A crônica da jornalista Miriam Leitão para o blog neste sábado

Acordei sem pressa e fui ler a crônica do Agualusa. O bom do sábado é a leitura livre. As manchetes podem esperar. Nos últimos dias tive uma ardência nos olhos que me fazia lacrimejar ao ler os jornais matinais. Não que não haja motivos para o choro, mas aquele era involuntário. Apenas um desfilar de lágrimas que atrapalhavam o meu encontro com as notícias. A médica receitou dois colírios que, depois de vários dias, começam a conter a aquosa irritação da vista diante da realidade cotidiana.

 

 

Agualusa escreve sobre a casa do escritor. Sonhou na infância com uma cheia de livros, mas hoje vive viajando para seus encontros, festivais, lançamentos, longe de casa. E admite que às vezes teve apenas um endereço virtual. Um desconhecido no aeroporto de Copenhague lhe entrega um livro que não consegue ler, porque está em dinamarquês, mas do qual extrai apenas o sentido de uma anotação em francês. Vai por aí a crônica.

 

 

Vou em outra leitura do Segundo Caderno do Globo. Uma entrevista com Ruy Castro em sua casa, cheia de livros atrás e na frente. E ele fala do seu novo livro. É de crônicas. “A arte de querer bem". Ele diz que quer que elas façam bem ao leitor, e contou o sentido da crônica. “Se você pega um jornal de 1942, está lá uma manchete bombástica, Brasil na Segunda Guerra Mundial. Mas isso virou história. Aí no meio daquele troço massudo, num quadradinho, tem o Rubem Braga falando por que, quando era garoto, decidiu que não seria conde. É uma alfinetada no Conde Matarazzo". O tempo passou para aquelas notícias, são outras as nossas guerras, mas lá ficou Rubem Braga como o mais interessante da página e sua implicância fina com um símbolo da elite. Fiquei com uma urgência de reler Rubem Braga.

 

 

Depois, demoro olhando a que pode ser a última foto de Machado de Assis, publicada por uma revista argentina, achada por um bancário que é pesquisador de Machado e Euclides da Cunha, Felipe Rissato. Ele está magro e elegantíssimo, oito meses antes de sua morte. Leva uma das mãos à cintura. Na que se tinha como última foto dele, Machado está em plena crise da doença que o afligiu a vida inteira, a epilepsia. O ataque o acometera em público. Ele certamente preferiria que ficasse como sua última imagem, não a da doença que jamais conseguiu controlar, mas altivo como está nessa foto que ficou no jornal Caras y Caretas da Argentina.

 

 


Há um momento da crônica em que alguém pode perguntar: por que você está me contando isso? Bom, queria falar hoje da leitura sem pressa, sem lágrimas, sem compromisso. A crônica precisa ser esse remanso, creio. No tempo sem tempo que vivemos, cercados de notícias de uma época conflagrada, é bom encontrar esses recantos.

 

 

Agora vem o que eu quero contar e estava acanhada. Não sei se interessará ao leitor, mas meu livro chegou. Ainda é uma amostra da gráfica, ele só estará nas livrarias no fim de julho. Em agosto será lançado. “Refúgio no sábado". Para ele selecionei algumas crônicas que escrevi aqui, no Blog do Matheus. Como é sempre possível sonhar, ficarei sonhando que os eventuais leitores gostem de uma ou outra. Quem sabe? Certamente apreciarão a decisão da editora: ela optou por um formato arredondado nas pontas, que dá ao livro um ar de caderno de notas. Gostei muito da capa azul, com detalhes em rosa. A capa descansa e o arredondado das pontas acolhe. A apresentação de Ana Maria Machado me deu extrema alegria. Tem sido bom escrever aqui como num pequeno espaço em meio aos conflitos do noticiário no qual, por gosto e escolha, vivo mergulhada. Selecionei 100, mas depois escrevi mais uma e pedi à editora que incluísse. E depois outra. Por fim, são 102 crônicas. É livro pequeno, fácil de carregar, que se pode ler da forma que quiser. Enfim, tudo isso digo com a esperança de ter leitores para esse meu refúgio no qual registro sentimentos das manhãs de sábado.

 

 

 

Fonte: G1

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