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07/09/2019 22:34
Cidades
Pinheiro: Tremor faz um ano e meio e moradores ainda convivem com incertezas
Ruas esvaziadas, insegurança, negócios fechando. Bairro conhecido "por ter tudo" em Maceió vai morrendo aos poucos
/ CLARIZA SANTOS

Um ano e seis meses e uma imensidão de incertezas. Viver diariamente com as consequências dos tremores de terra provocados, segundo a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), pelas atividades mineradoras da Braskem, em Maceió, não tem sido uma missão fácil. Com os imóveis rachados e estruturas comprometidas, muitas famílias tiveram que sair do bairro do Pinheiro e deixar para trás toda uma história de vida. Mais que isso: Precisaram abrir mão de um bem adquirido às custas de muito esforço. Precisaram recomeçar.

 

 

Conhecido em Maceió como um bairro "onde tem tudo" e que "é perto de tudo", o Pinheiro se transformou nos últimos meses. Com ruas esvaziadas e, algumas delas, isoladas pela Defesa Civil, o bairro virou alvo fácil da ação de bandidos. O volume de carros que trafega no local diminuiu e já não se veem mais as pessoas conversando nas praças - como a Menino Jesus de Praga -, como há pouco tempo era possível ver. Os problemas estruturais em prédios situados por lá não são recentes. Em meados de 2010, em pleno inverno de Maceió, ao menos um prédio de um dos conjuntos habitacionais mais conhecidos da região, o Jardim das Acácias, já apresentava rachaduras que anunciavam o que estava por vir. À época, o problema foi minimizado pelas autoridades competentes e os moradores tiveram que arcar com as despesas de uma obra para preenchimento da estrutura abaixo do piso, que estava oca.

 


Os anos se passaram e parecia que a situação estava resolvida. Até que, em março de 2018, um tremor de terra sentido na localidade e em outros bairros das proximidades, deu sinais de que algo sério estava acontecendo. Começava aí uma saga que, até hoje, não teve fim.

 

 

As ações para tentar minimizar os problemas ocasionados pela atividade mineradora em Maceió envolveram praticamente a Prefeitura de Maceió e o Governo Federal - que enviou recursos para o pagamento do aluguel social para quem precisou se mudar de casa. Por parte do estado, no entanto, nada se viu de ações efetivas para ajudar os moradores do Pinheiro, Mutange e Bebedouro. Diversos ofícios chegaram a ser enviados pelo prefeito Rui Palmeira ao governador Renan Filho, mas os pedidos de socorro não surtiram efeito até hoje.

 

 

A prefeitura já abriu mão dos valores que cabiam ao município referentes ao IPVA e ICMS, arrecadados nos três bairros afetados pelas rachaduras. "Assinei um ofício que foi encaminhado ao governador Renan Filho, abrindo mão da parte que cabe à Prefeitura de Maceió do IPVA e ICMS, referente à região dos três bairros. Temos cobrado mais participação do Estado; encaminhamos alguns ofícios para o governador que, até hoje, estão sem resposta, para que o governador possa, pelo menos, amenizar a situação da população desses bairros, concedendo a isenção fiscal do ICMS e IPVA. A prefeitura já cumpriu o seu papel", disse o prefeito Rui Palmeira.
Já a Braskem informou que realizou uma série de estudos geológicos e mobilizou os melhores especialistas, no Brasil e de renome internacional, visando o completo entendimento dos fenômenos que têm impactado os bairros do Pinheiro, Mutange e Bebedouro. A empresa destaca que, no momento, atua na conclusão dos estudos de sonar, considerados fundamentais para compreensão das causas. A extração de sal e a operação na fábrica de Cloro Soda, no Pontal da Barra, estão paralisadas desde maio deste ano. E a mineradora não voltará a explorar sal nos três bairros afetados pelos problemas.

 

 

Além disso, desde 11 de abril deste ano, através de termo de cooperação técnica firmado com autoridades, a Braskem realiza ações de apoio à comunidade do bairro do Pinheiro e região. As que já foram concluídas incluem: inspeção da principal rede do sistema de drenagem pluvial do Pinheiro; doação e instalação de equipamentos da Central de Monitoramento da Defesa Civil de Maceió; instalação de uma estação meteorológica e um sistema de monitoramento de movimentação do solo por GPS de alta precisão, além da inspeção predial de escolas e conjuntos habitacionais localizados em áreas críticas do bairro.

 

 

Vidas foram modificadas - Quando chegou ao bairro, em 1976, Nazidir Pereira, de 63 anos, relata que só tinha vegetação e algumas poucas edificações em processo de construção. Recentemente, o que parecia um dia comum na rotina da dona de casa, foi modificado devido aos abalos de terra sentidos na localidade. Ela não sabia o que estava acontecendo, mas era uma das primeiras manifestações de algo que transformaria a rotina não só dela, mas de toda a comunidade. Apesar de sua residência não ter sido abalada diretamente e não apresentar rachaduras evidentes, outros apartamentos e a estrutura do prédio em que mora apresentam fissuras que se avolumam.
"Quando cheguei aqui não tinha nada. Era só mato. O ônibus ainda passava, mas, com pouco movimento e era seguro, foi logo no início. Agora, o bairro está abandonado, como se fosse um bairro fantasma. A gente não vê ninguém, só 'as pessoas nas motoquinhas' que roubam as pessoas. Você sai na rua, hoje em dia, e tem que olhar para todos os lados. Para ir na esquina, onde fica o mercadinho, temos o maior cuidado. Agora, imagina se o mercadinho fecha? Nós vamos ficar à mercê", afirma a moradora, que viu ser realizado no bairro o sonho da casa própria.

 

 

A aposentada Nádia Maria Ribeiro Batista, de 65 anos, viu o sonho da casa própria ser destruído com o aparecimento das rachaduras. "Agora sinto muita angústia por estar perdendo minha casa. Morei fora do Estado e, assim que retornei, procurei casa para comprar. Logo me agradei do bairro, que era tranquilo e perto dos meus pais. Recordo de muitas coisas boas vividas aqui. Foi onde criei meus filhos. Os meus netos nasceram aqui", contou emocionada.

 

 

Quando percebeu que a casa não mais apresentava segurança, a aposentada saiu do imóvel junto com o filho, o personal trainer Dudu Ribeiro. "Recebi a notícia com muita tristeza. Vi minha casa, que adquiri com tanto esforço, afundar. Sem ter resposta do que pode acontecer de pior, não existe uma clareza no que está acontecendo. Estamos morando em uma casa muito menor, tivemos que nos desfazer de alguns bens e até mesmo deixar na casa do Pinheiro outros. O valor do aluguel social quase não dá para pagar o aluguel de onde estamos morando atualmente", informou.
No bairro, empresários e comerciantes amargam prejuízos financeiros difíceis de mensurar. Sem clientes, os negócios começaram a "afundar" e muitos fecharam as portas no bairro.

 

 

O empresário Gustavo Martins diz que o supermercado de sua propriedade tornou-se, há muitos anos, referência no bairro do Pinheiro. Ele relata que chegou a empregar 43 pessoas e, devido aos problemas, teve que demitir em massa. Atualmente, ele tem apenas 18 funcionários.

 

 

"As vendas hoje representam 45% do que eram antes, e ainda tenho um prejuízo mensal de R$ 50 mil. Quando as demissões aconteceram, o Ministério Público do Trabalho disse que eu podia ficar isento das rescisões, devido ao decreto de calamidade, mas, não achei justo. Eram funcionários, que prestavam serviços. Muitos, inclusive, antigos", continuou dizendo que, há 35 anos no bairro, onde também faz morada, com a família, nunca viu uma situação mexer tanto com o emocional dos moradores.

 

FONTE: GAZETAWEB

"Muitas pessoas morreram, até. Uma idosa que resistia sair, quando, enfim, a família a retirou do apartamento, entrou em depressão e, três dias depois, morreu de infarto. Muitos casamentos foram desfeitos, tudo por causa da situação. Quando eu demiti os meus funcionários, chamei uma psicóloga para nos auxiliar, para fazer com que eles entendessem a real situação", salientou.

Para continuar com o negócio aberto, algumas medidas precisaram ser adotadas. "Diminuí as prateleiras de tamanho, deixei o estoque dentro da loja. Negociei com os fornecedores", contou Gustavo.

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